RESSENTIMENTOS PASSIVOS

Posted: domingo, 25 de setembro de 2011 by Anônimo in Marcadores:
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Ouvi Soninha Francine, ex-vj da MTV que hoje é vereadora, explicando a razão de escolher a carreira política. Soninha disse que, preocupada em cumprir um papel social, fazia parte de um grupo que dava aulas de teatro para crianças em favelas. E achava legal. Mas quando as crianças terminavam a atividade e voltavam para casa, continuavam ameaçadas pela pobreza, pela violência e pelo tráfico de drogas. A sensação de que seu trabalho social não rendia fez Soninha ingressar na política. Como vereadora ela teria mais poder e capacidade de influenciar na criação e na revisão das leis e normas que causam impacto na sociedade.

Pois é. Soninha sabe que está se metendo no meio de cobras e que a imagem dos políticos nunca esteve tão por baixo. Mas também sabe que, de fora, o máximo que conseguiria fazer seria expor seus ressentimentos passivos. Ressentimentos passivos.


Você também é mais um (ou uma) dos que preenchem seu tempo com ressentimentos passivos? Conhece gente assim? Pois é. O Brasil tem milhões de brasileiros que gastam sua energia distribuindo ressentimentos passivos. Olham o escândalo na televisão e exclamam “que horror”. Sabem do roubo do político e exclamam “que vergonha”. Vêem a fila de aposentados ao sol e exclamam “que absurdo”. Assistem a quase pornografia no programa dominical de televisão e dizem “que baixaria”. Assustam-se com os ataques dos criminosos e choram ”que medo”. E pronto!


Pois acho que precisamos de uma transição “nestepaíz”. Do ressentimento passivo à participação ativa. A minha transição começou quando li num texto de érico Veríssimo um trecho delicioso:


..."o menos que um escritor pode fazer, numa época de atrocidades como a nossa, é acender a sua lâmpada, fazer luz sobre a realidade de seu mundo, evitando que sobre ele caia a escuridão, propícia aos ladrões, aos assassinos e aos tiranos. Sim, segurar a lâmpada, a despeito da náusea e do horror. Se não tivermos uma lâmpada elétrica, acendamos o nosso toco de vela ou, em último caso, risquemos fósforos repetidamente, como sinal de que não desertamos nosso posto."


E tudo ficou mais fácil quando entendi que não preciso mudar a vida de 180 milhões de brasileiros. Basta começar mudando a vida de um. Veio daí a motivação para lançar meus textos na internet, manter meus sites, escrever e distribuir meus livros, fazer minhas palestras, meus comentários em rádio e tudo que ainda vem por aí. Não sei se provoquei alguma mudança em alguém. Mas acredito que estou cumprindo um papel. Homeopático, pequenino e simples. Pra mim, relevante. Tem gente que escreve me chamando de ególatra, metido e elitista. Para essas pessoas, eu incomodaria menos se permanecesse confortavelmente usufruindo da vida de executivo de uma multinacional, pacatamente curtindo meus ressentimentos passivos. é uma opção. Mas acho que sou parecido com a Soninha, sem a coragem dela. Ela comprou a briga. Virou vereadora, meteu os pés num ambiente recheado de lama. Incomoda-se, ouve abobrinhas, sofre com os conchavos e, se bobear, é ofendida na rua. Mas ela sabe que uma idéia sua bem implantada muda a vida de milhares de brasileiros.

Soninha encontrou um jeito de mudar o mundo, mudando o sistema. De dentro.

Soninha escolheu participar ativamente.

Quem mais tem a coragem dela?





Luciano Pires é jornalista, escritor, conferencista e cartunista. Faça parte do Movimento pela Despocotização do Brasil, acesse www.lucianopires.com.br.

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